Por Carlos Bernardo Loureiro
A revista alemã Zeitschruffuer Metapsysche Forshung, do ano de 1932, veicula uma matéria de autoria do Dr. Carl A. Wickland, psiquiatra norte-americano autor do livro Thirty Years Among the Dead (Trinta Anos entre os Mortos), trabalho muito citado como um clássico da literatura psíquica, editado em 1924 e reeditado, na década de 1970, pela Spiritualist Press de Londres.
Na citada revista alemã, o Dr. Wickland relata um caso intrigante de obsessão, em que uma menina (que apresentava uma aparência senil) via-se pertinazmente assediada por uma velha senhora desencarnada em 1870. “Para nós – elucida o Dr. Wickland, no preâmbulo do artigo – já não existe mais a pergunta: haverá realmente uma continuação da vida do Espírito depois da morte? O que devemos fazer para despertar a Humanidade do seu sono de letargia e convencê-la de que a vida além-túmulo é um fato. Mais ainda: que a alma dos desencarnados muitas vezes intervêm nos acontecimentos de nossa vida corpórea.”
Eis os trâmites do caso referido: O médico Dr. S. levou para uma sessão de cura (desobsessão) no National Psychical Institut, dirigido pelo Dr. Carl Wickland, uma menina de 12 nos, cujo sofrimento tivera resistido a todos os tratamentos regulares da ciência oficial. Havia três anos que essa jovem era inválida, tendo perdido por completo o domínio sobre os seus membros. Às vezes, passava vários dias em surdez e absoluto mutismo, do qual ninguém conseguia demovê-la, e apresentava a aparência de uma velha... O Dr. Wickland, ao constatar que se tratava de um singular processo obsessivo, empreendeu, em vão, todos os meios persuasivos para conseguir manifestação do Espírito. Recorreu, então, ao método extremo – choques elétricos na paciente, “forçando” o afastamento do obsessor, que se “incorporou” na médium, sua esposa, a Sra. Wickland.
Seguem-se as perguntas e respostas, como acontece em sessões espíritas de doutrinação. O Espírito, após demorado trabalho de persuasão, admite a realidade da vida espiritual e conta sua história. Fizera parte de uma seita religiosa, onde prevaleciam a superstição e um profundo fanatismo religioso. Arrepende-se e pede ao Dr. Wickland que dissesse à menina que nunca mais iria perturbá-la. Em seguida, despede-se dizendo que ia embora com esta gente (Espíritos) que se achava ao seu redor...
Daí em diante, a menina (Jennie Brown) começou a transmudar a sua feição física; ressurge na plenitude e no frescor de seus 12 anos, transbordando de alegria.
O Estranho Método do Dr. Wickland
O trabalho do Dr. Carl Wickland — embora utilizasse o estranho método do choque elétrico (uso da eletricidade estática) para “deslocar” o Espírito obsessor — é notável. Os resultados que obteve, no campo de desobsessão, foram surpreendentes, livrando um sem-número de pacientes da tristíssima clausura em manicômios e sanatórios psiquiátricos, onde iriam, inevitavelmente, se encharcar de barbitúricos.
A capa do livro Thirty Years Among the Dead estampa a opinião de Sir Arthur Conan Doyle, o criador do legendário Sherlock Holmes e autor da obra História do Espiritismo.
“A demonstração psíquica feita pela Senhora Wickland” — opina o célebre escritor britânico — “foi certamente uma extraordinária realização e nos deixa a todos em estado de estupefata admiração. Foi muito impressiva. Jamais encontrei alguém que possuísse tão ampla experiência dos ‘invisíveis’ como o Dr. Wickland. Seu sistema é baseado em considerável quantidade de experimentação direta e observação. Se ele conseguir convencer — acho que o conseguirá —, seu nome será lembrado como o de Harvey ou Lister ou qualquer outro grande mestre revolucionário da ciência médica – e, no entanto, todo o seu sistema não passa de uma volta ao princípio que era lugar-comum ao tempo do Cristo.”
No prefácio da obra, Carl Wickland escreveu: “Leia, não para condenar, mas para ponderar e considerar”. E, adiante, afirma que não pretende “promulgar nenhum ‘ismo’ ou culto, mas apresentar os relatos e deduções de trinta anos de pesquisa experimental na ciência da psicologia normal e anormal”.
No capítulo a que deu o título O Inter-relacionamento dos Dois Mundos, dirige-se, o psiquiatra norte-americano, aos que apenas creem no que pode ser aferido pelos sentidos: “A natureza visível não é mais do que o invisível, o real, tornado manifesto por meio de uma combinação de elementos... E, linhas adiante: “... nenhum outro assunto tem sido tão bem autenticado através dos tempos e em toda a literatura como o da existência do Espírito e da vida futura”.
E, à guisa de exemplo, retroage à Grécia clássica, Roma e aos primórdios do cristianismo, quando a crença no Espírito era uma questão de ordem natural, simplesmente consolidada. Entre as opiniões citadas pelo Dr. Wickland destacam-se as de Heródoto, Sófocles, Eurípedes, Platão, Horácio, Virgílio, Plutarco, Flavius Josephus e os luminares da Escola de Alexandria. Modernamente, lembra a figura de John Wesley, conhecido teólogo reformista, autor do livro O Mundo Invisível, onde se inserem estas palavras: “É fato que os ingleses em geral” – na verdade a maior parte dos sábios europeus – “consideram os relatos de feiticeiras e aparições como fábulas”. Wesley protesta, com veemência, contra esse radicalismo. Outros pesquisadores são citados pelo Sr. Wickland, permitindo-lhe, ante a opiniões por ele formuladas, emitir o seguinte parecer:
“O mundo espiritual e o físico estão em constante interação; o plano espiritual não é uma vaga intangibilidade, mas real e natural, uma vasta zona de substância refinada, de atividade e progresso, e a vida ali é uma continuação da vida no mundo físico”.
O ser-para-a-morte
“O fenômeno da morte ocorre de maneira tão natural e simples que grande número de pessoas, depois de abandonarem o corpo físico, não tem consciência de que a transição se deu e, sem conhecimento da vida espiritual, ficam totalmente inconscientes do fato de haverem passado para um outro lado do ser”. Ademais, a morte não transforma ninguém em santo ou um ignorante em sábio. E as reações dos desencarnados variam. Há os que não conseguem libertar-se dos interesses materiais; a maioria, na verdade, fica perdida e confusa. Não raro “impelidos por inclinações maldosas buscam uma evasão para suas tendências, permanecendo em tais condições até que esses desejos destrutivos sejam superados, quando a alma brada por compreensão e luz, e os Espíritos evoluídos conseguem alcançá-los e ajudá-los”. Estas conclusões do Dr. Wickland lembram as elucidações do professor Herculano Pires, no prefácio à quarta edição da obra O Que é a Morte, do Dr. Carlos Imbassahy.
Ei-las: “— Coisa horrível é a morte! — dizia-nos um amigo, que aliás já embarcou — sabe-se lá como é esse Outro Mundo? Vocês, espíritas, estão muito convencidos de sabê-lo. Mas eu é que não vou nessa conversa. Prefiro continuar por aqui, pois já conheço este mundo. Fiquem vocês com a morte e deixe-me com a vida!”
“Por sinal – prossegue o prof. J. H. Pires –, depois de passar para o lado de lá, de maneira abrupta, desconcertante, ainda muito moço, fomos encontrá-lo em estado de confusão. Era um vasto recinto espiritual. Quando nos viu, exclamou: ‘Ah, bem me dizia o coração que você era um amigo de verdade!’ Conversamos longamente e ele acabou confessando-nos que jamais esperava encontrar na morte uma vida nova. Entretanto – explicamos-lhe – aqui também se morre, voltando à vida terrena. E ele, que não conhecia Heidegger (Martin Heidegger, filósofo alemão, 1889–1976), respondeu-nos com um sorriso heideggeriano: ‘Sim, reencarna-se’. Eis como o ‘se’ – observa J. H. Pires – funciona nos dois lados da vida, nas duas formas de existência. Ao dizer que ‘se morre’ equivale a uma fuga pessoal à morte... o indivíduo descarrega na espécie humana o problema da morte e mergulha no mundo. Sim, morre-se, mas também vive-se. Este ‘se’ impessoal, abstrato, difuso, é uma escapatória. Quando desejamos esconder algo, recorremos à fórmula: diz-se, conta-se, afirma-se, etc. Conclui o ilustre autor de O Ser e a Serenidade’: “A análise existencial da morte, feita por Heidegger, mostra-nos que o homem, ‘ser-para-a-morte’, ao dizer ‘morre-se’, está excluindo a si mesmo, como ser real, da ameaça da morte’”...
Essas teses de Heidegger encontram-se firmadas na sua obra O Ser e o Tempo, de 1927, ampliadas e substanciadas na crítica da Metafísica (Que é a Metafísica, 1929).
Em dado momento, o Dr. Wickland trata do problema obsessional. A linhas tantas, observa: “(...) os pensamentos e impulsos do espírito passam a atuar sobre o ser encarnado, provocando distúrbios de toda a sorte: confusão de sentimentos, angústias e sofrimentos. São os demônios de todos os tempos”...
“A influência dessas entidades” – continua o Dr. Carl Wickland – “é causa de muitos acontecimentos inexplicáveis e obscuros da vida terrena e, em grande parte, da infelicidade do mundo. Pureza de vida e de motivação, ou elevada intelectualidade não oferecem necessariamente proteção contra a obsessão; a identificação e conhecimento desses problemas são a única proteção.” “A Humanidade” – prossegue o ilustre psiquiatra – “está envolvida pela influência do pensamento de milhões de seres desencarnados que ainda não alcançaram integral compreensão dos objetivos mais elevados da vida. O reconhecimento desse fato explica uma grande porção de pensamentos indesejáveis, emoções, estranhos presságios, estados de depressão, irritabilidade, impulsos desarrazoados, explosões irracionais de temperamento, paixões incontroláveis e inúmeras outras manifestações mentais”.
O início dos trabalhos do Dr. Carl Wickland
Relata o jornalista e escritor Hermínio Miranda (Vide Reformador – FEB, janeiro de 1972): “O Dr. Wickland sabia que a experimentação às cegas poderia suscitar problemas sérios e deformações mentais. Conhecia casos em que pessoas sem experiência e invigilantes ficaram seriamente perturbadas em consequência de brincadeiras, tidas por inocentes, com o copo ou com o indicador alfabético. Isso, porém, não invalidava seus propósitos; pelo contrário, o estimulava a enveredar pela pesquisa para descobrir as razões ocultas dos fenômenos”. Verificou que sua esposa era médium dotada de grandes recursos, e que evitava a experimentação por julgar que estaria “perturbando os mortos” indevidamente. A isso responderam os Espíritos comunicantes que as concepções usuais sobre a sociedade póstuma estavam completamente equivocadas. Explicaram que, na realidade, não existe a morte, mas uma simples transição do mundo visível para o invisível, e que muitos Espíritos se esforçam por se comunicar com os homens, a fim de esclarecê-los e ajudá-los. E mais – se o Dr. Wickland quisesse, eles, os Espíritos, se incumbiriam de trazer entidades atormentadas para tratamento e observação; manteriam tudo sob estrita vigilância e controle. A proposta foi aceita. Seguiram-se alguns fenômenos convincentes, ilustrando o mecanismo que o médico começara a analisar, com a inestimável colaboração de Anna Wickland.
“Certo dia – relata o Dr. Wickland –, ao voltar para casa à tarde, tive uma surpresa. Minha mulher manifestou súbito mal-estar, queixando-se de estranhas sensações. Estava quase a cair, quando empertigou-se e disse: – “Que história é essa de me cortar?” .
O Dr. Wickland estivera fazendo um estudo de anatomia, dissecando a perna do cadáver de um homem de 60 anos. Respondeu-lhe que não estava cortando ninguém, mas o Espírito, indignado, replicou: – “Naturalmente que está. Você está cortando a minha perna...” O Dr. Wickland descobriu que o manifestante era o “dono” do cadáver e se dispôs a uma longa conversação com ele. O Espírito não aceitava o procedimento do Dr. Wickland... Com o passar do tempo, a entidade espiritual cedeu às lúcidas argumentações do doutrinador, admitindo, finalmente: “Acho que devo estar naquele estado a que chamam de ‘morto’. Então, de nada me serve mais o meu velho corpo. Se você pode aprender alguma coisa cortando-o, prossiga e corte o que quiser”. E daí, pediu um pouco de fumo para mascar, sendo-lhe negado. Este desejo do Espírito serviu como elemento comprobatório, porque o Dr. Wickland, reexaminando, posteriormente, o cadáver, constatou tratara-se, quem o animou, de um inveterado consumidor de tabaco...
Espíritos esclarecidos não promovem, por si sós, a desobsessão
Uma pergunta poderia, então, surgir, observa o Dr. Wickland: Por que as inteligências mais evoluídas não tomam conta dos Espíritos perturbados para esclarecê-los, sem necessidade de recorrer ao médium? É que muitos desses Espíritos se acham de tal maneira envolvidos pelas suas fixações e impressões terrenas, que somente se tornam acessíveis quando postos em contato com as condições físicas que experimentavam quando na carne. Uma vez conscientes do novo estado em que se encontram depois da morte, torna-se mais fácil o caminho da recuperação total. Muitos deles são difíceis de doutrinar e esclarecer, por causa do entranhado dogmatismo de suas opiniões ou de suas paixões, seus ódios e frustrações.
“Quanto à médium” – refere-se à esposa, Anna Wickland – “a despeito de tão longos anos de trabalho psíquico e de demonstrar toda aquela terrível seqüência de distúrbios mentais temporários, jamais sofreu qualquer disfunção psíquica. Foi sempre equilibrada, sadia, positiva, racio-nal. Exerceu sua faculdade mediúnica durante 35 (trinta e cinco) anos.
O Dr. Wickland e a reencarnação
Ainda o jornalista e escritor Hermínio Miranda, no artigo citado, considera a obra do Dr. Wickland “séria e construtiva”. Mas adverte: Apenas um ‘senão’ – aliás, muito importante – se infiltrou sutilmente no acervo de dados que reuniu pacientemente ao longo dos anos: ele não apenas recusava a idéia da reencarnação, como tentou demonstrar que chegava a ser prejudicial à evolução do Espírito!”
No capítulo XV, por exemplo, da obra Thirty Years Among The Dead, escreveu o médico norte-americano: “Que a crença na reencarnação na Terra é falaz e impede o progresso às mais elevadas esferas espirituais, ao passo que numerosos casos de obsessão trazidos ao nosso cuidado são devidos a Espíritos que, na ânsia de se ‘reencarnarem’ em crianças (!), encontram-se prisioneiros de suas auras magnéticas, causando grande sofrimento tanto às suas vítimas como a si mesmos”.
O texto revela que o Dr. Wickland desconhecia, por completo, o princípio da reencarnação, assumindo, entretanto, uma postura incisiva a respeito, fruto das deduções extraídas das comunicações de Espíritos perturbados, e não evoluídos. Relata alguns casos que evidenciam o desacerto de suas teses anti-reencarnacionistas.
O primeiro caso é o do menino Jack T., de Chicago, que, a partir dos cinco anos de idade, começou a manifestar estranhos sinais de perturbação e, sob certos aspectos, precocidade. Preocupava-se com ninharias, permanecia longas horas acordado durante a noite, ruminando pressentimentos e manifestando, às vezes, um temperamento incontrolável... queixava-se de sua “velhice” e de sua “feiúra”. A família procurou o Dr. Wickland, que procedeu à desobsessão, através de sua esposa. O Espírito atraído disse chamar-se Charles Herrman. Sabia que havia “morrido” e declarou ser muito feio e que ninguém gostava dele. Como alguém lhe dissera um dia que as pessoas morrem e se reencarnam, ele só pensava em renascer num corpo bonito e elegante, no qual fosse amado. Sem conhecimento de espécie alguma dos mecanismos do plano espiritual, pensou que poderia tomar conta do primeiro menino bonito que encontrasse. E, assim, ligou-se a Jack T., a quem transferiu os seus problemas espirituais...
Baseado neste e em casos semelhantes, o Dr. Wickland tenta demonstrar que a reencarnação é causadora de obsessão...
Mas vale a pena citar o que aconteceu ao menino J. A., de sete anos, assediado pelo Espírito por nome Edward Jackson, que tentava “reencarnar” a todo custo. Era a sua quarta experiência nesse sentido, sempre procurando apossar-se do corpo de uma criança. Em dado momento da comunicação, o experimentador pergunta: “Você não acha que é melhor parar com essas tentativas de reencarnação?”
Em janeiro de 1920, manifesta-se uma entidade que disse chamar-se Ella Wheeler Wilcox, cujas ideias esposadas, através da Sra. Anna Wickland, vêm confundir, ainda mais, o espírito do investigador sobre a palingenesia. – “Seja cauteloso na procura da verdade, pois a estrada é perigosa... Houve uma época em que eu admiti a reencarnação. Fui, por algum tempo, teosofista. A Teosofia é uma boa doutrina; seus pensamentos e ensinamentos são belos; mas, por que deveremos reencarnar neste pequeno planeta? Eu não gostaria de voltar ao plano terrestre, exceto para falar a vocês acerca da vida mais elevada e real que os espera. Não gostaria de voltar a este plano terrestre, novamente, para ser um bebezinho. Não vejo por que eu deveria fazer isso, pois o que teria eu a aprender? Poderiam as almas como nós voltar a ser criança e sentirem-se satisfeitas?”.
A comunicação do Espírito Ella Wheeler Wilcoox se encaixa, como uma luva, nestas oportunas advertências de Kardec, inseridas na Instrução de O Evangelho Segundo o Espiritismo”: “Sabe-se que os Espíritos, em consequência das suas diferenças de capacidade, estão longe de possuir, individualmente, toda a verdade; que não é dado a todos penetrar certos mistérios; que o seu saber é proporcional à sua depuração; que os Espíritos vulgares não sabem mais que os homens; que há, entre eles, como entre estes, presunçosos e falsos sábios, que crêem saber aquilo que não sabem sistemáticos, que tomam suas próprias ideias pela verdade...”
Finalmente, o Dr. Wickland encerra o rol de depoimentos espirituais sobre a reencarnação, com o ditado mediúnico de Helena P. Blavatsky, em 1º de novembro de 1922.
O Espírito da fundadora da Teosofia – ou o Espírito que tomou o seu nome – afirma que, por algum tempo, sentiu-se atraída pela ideia da reencarnação, que explica as diferenças de fortuna e virtudes entre os seus. Por outro lado, admite que nas existências muito curtas o Espírito encarnado não adquire suficiente experiência na Terra. Diz, ainda, que teve lembranças de suas passadas vidas, mas achou que eram apenas impressões que outros Espíritos lhe traziam. Conclui, por fim, que a doutrina da reencarnação era falsa, argumentando: – “Por que voltaria você a viver uma nova existência quando já adquiriu experiência e compreensão enquanto aqui esteve? Além do mais – adiantou a Sra. Blavatsky (ou quem se utilizava de seu nome famoso) –, você corre o risco de entrar num corpo doentio e defeituoso e ficar ainda em pior situação do que antes!” (!)
Acreditou na reencarnação, pregou-a e desencarnou convicta de que retornaria ao plano corpóreo. Todavia, desprezou não apenas o princípio das vidas sucessivas, mas o que ele moral e filosoficamente, a ponto de proclamar:
– “Por que desceria eu da harmonia do mundo espiritual para aquilo a que poderíamos chamar inferno?”
Em seguida, e profundamente contraditória, o que denuncia o seu desequilíbrio, arremata:
– “Poderia ter feito tanto mais do que fiz se tivesse continuado com o exercício da minha mediunidade trabalhando para aproximar os dois mundos. Fui médium e poderia ter realizado uma grande tarefa, mas me tornei obsidiada”...
O capítulo dedicado à reencarnação não invalida, em absoluto, o notável trabalho do Dr. Wickland e de sua esposa Anna; “pelo contrário”, afirma Hermínio de Miranda, “demonstra de maneira dramática que a vaidade e o orgulho continuam a atormentar o Espírito no mundo póstumo, de maneira tão arrasadora, que ele se julga dono de toda a verdade e livre das leis divinas que nos traçam longos e pacientes programas de recuperação”.
Acodem-nos à memória, a propósito, os versos sábios da comovedora oração do Espírito Glaucus (vide Nos Bastidores da Obsessão, FEB, psicografado por Divaldo Franco):
Ampara-nos, Construtor da Vida!
Amanhece o dia do novo ensejo e logo mais mergulharemos no caudaloso rio da reencarnação.
Reencontraremos o ódio ultrajando nossas aquisições e o sofrimento dificultando nosso avanço.
Dá-nos a tua mão protetora! Somos o que fomos, ajuda-nos a ser o que devemos!...
Artigo publicado no Suplemento Literário – Ano XIV nº 166 – Novembro de 1993 – Págs. 2 e 3.