Por Lucas Sampaio
Deve-se ao genial polímata sueco Emanuel Swedenborg (1688-1772) o primeiro uso das expressões “médium” e “mediunidade” em sentido mais próximo ao que lhes empresta o Espiritismo, mas ainda como "substância ou meio através do qual ocorre um fenômeno”, segundo informam o Dictionnaire Etymologique des Anglicismes et des Américanismes[1] de Jean-Paul Kurtz, e o Trésor de La Langue Française[2].
Embora seu sistema fosse teológico[3], místico e contivesse equívocos[4], nota-se inicialmente o uso da expressão a partir de 1749, em diversas tentativas imprecisas de identificar quais seriam os intermediários (“mediums” na tradução do latim para o inglês) entre Deus (ou o divino) e o mundo natural, como, por exemplo, os anjos, a “palavra” de Deus, os espíritos e o próprio Homem[5].
Finalmente, em 1759, ele afirma em sua obra “Céu e Inferno”: “Deve-se entender que o Homem é o meio pelo qual o mundo natural e o mundo espiritual estão unidos, isto é, o Homem é o meio de união [medium of conjunction], porque nele há um mundo natural e um mundo espiritual; Consequentemente, à medida que o Homem é espiritual (e não natural), ele é o meio de união (...); Porém, além desta mediação [mediumship] do homem, persiste um influxo divino no mundo e nas coisas humanas, mas não sobre a faculdade racional do homem”[6] (tradução livre).
Apesar dos vocábulos referirem-se à função do meio e ao ato da mediação e não à denominação subjetiva do medianeiro e seu atributo específico da mediunidade, é provável que palavras inglesas medium (médium) e mediumship (mediunidade) tenham assumindo vulgarmente esses significados a partir daí, em razão da grande popularidade do trabalho do vidente sueco entre muitos espiritualistas na Europa e na América dos séculos 18 e 19.
Mas foi a partir de 1848, com os eventos com as irmãs Fox e a organização do Espiritualismo Moderno, que pessoas capazes de se comunicar com os mortos passaram a ser designadas nos Estados Unidos como médiuns, como afirma J. Gordon na sua Encyclopedia of Occultism and Parapsychology[7] e como corrobora a pesquisadora francesa Marion Aubrée, acrescentando no Dictionnaire des Faits Religieux[8], que esse termo chegou em França com os seus primeiros divulgadores, por volta de 1852.
Diversas comunicações relevantes com o nome de Swedenborg foram registradas mais tarde, sempre relacionadas ao surgimento do movimento espiritual racionalista que se viria a implantar: Andrew Jackson Davis (1844), Alphonse Cahagnet (1847) e Allan Kardec (1857). Provavelmente ali se manifestava o próprio, dado o conteúdo e o propósito demonstrados.
Swedenborg não foi um pesquisador da mediunidade – não se propunha a isso – e parece não ter conhecido outros fenômenos mediúnicos além daqueles que protagonizou. Conforme assinala Carlos Bernardo Loureiro, “na verdade, Swedenborg era simplesmente um médium vidente e um escritor intuitivo, como os há aos milhares, faculdade que pertence ao rol dos fenômenos naturais”[9].
O suficiente para, com seu grande trabalho, imprimir novo significado ao vocábulo e lançar novas e fecundas luzes sobre o terreno do conhecimento espiritual, preparando-o para descobertas mais consistentes que se avizinhavam.
Colaborou Herivelto Carvalho
[1] Dictionnaire Etymologique des Anglicismes et des Américanismes – Jean-Paul Kurtz - BoD - Books on Demand, vol. 2, 2013
[2] Le Trésor de La Langue Française informatisé – www.atilf.fr – consultado em 22/06/2017
[3] O conceito swedenborguiano era próximo à ideia de “dons da graça”
[4] Além de seu sistema de correspondências não se ter confirmado através do método de Kardec, comunicações mediúnicas com a assinatura de Swedenborg na RE de nov/1859 indicavam que o mesmo o reconheceu como ficção.
[5] Arcana Coelestia – Emanuel Swedenborg, 1749-1756
[6] Heaven and Hell – Emanuel Swedenborg, 1759, trad. do latim para o inglês por John C. Ager
[7] Encyclopedia of Occultism and Parapsychology – J. Gordon Melton, Gale Group, 2001
[8] Dictionnaire des Faits Religieux – Régine Azria e Danièle Hervieu-Léger, Presses Universitaires de France, 2010
[9] Vida e Obra dos Espíritos que assinaram os prolegômenos do Livro dos Espíritos – Carlos Bernardo Loureiro – Teatro Espírita Leopoldo Machado – Salvador-BA